quarta-feira, 17 de dezembro de 2014

Como começar a praticar 'atma-vichara'?


http://www.sriramanamaharshi.org

Oh! Arunachala, tal como Azhagu e Sundara
deixa eu e Tu sermos completamente não-diferentes!


Azhagu - Palavra Tamil para 'Beleza' 
Sundara - Palavra Sanscrita para 'Beleza'

ARUNACHALA AKSHARAMANAMALAI
Grinalda de noivado de poemas para Arunachala - Poema 2






Fonte: 

Michael James
http://happinessofbeing.blogspot.pt/2009/04/how-to-start-practising-atma-vichara.html



Quinta-feira, 16 Abril 2009


Um amigo escreveu-me recentemente perguntando:


Como começar com atma vichara?? Alguns dizem "olhe para os seus pensamentos", outros dizem "veja de onde surgem", e  outros dizem "veja quem faz tudo isso" - qual é que se deve seguir??? Aquele vê não é também mente???
Apesar de a graça do guru estar sempre a fluir, por que é que nem sempre conseguimos praticar atma vichara???
Agradeço a gentileza de me esclarecer sobre a prática de atma vichara, porque muitas vezes duvido se estou a fazer vichara correctamente.


O que se segue é a resposta que escrevi:

Ātma-vichāra não é olhar para qualquer outro pensamento diferente do nosso pensamento primordial "eu", que pensa todos os outros pensamentos.

Todos os outros pensamentos são anātma (não-ser), anya (diferentes de nós mesmos) e jada (não-conscientes), e portanto não podemos conhecer o nosso verdadeiro ser olhando para eles. Estamos constantemente a olhar para os nossos pensamentos ao longo dos nossos estados de vigília e de sonho, mas nem por isso conhecemos o nosso verdadeiro ser. De facto, a nossa atenção aos pensamentos é o obstáculo que obscurece o nosso conhecimento de nós mesmos, porque só podemos observar os nossos pensamentos quando experimentamos a nós mesmos como uma mente pensante.

O único pensamento para o qual deveríamos olhar a fim de conhecer a nós mesmos como realmente somos é o nosso pensamento primordial "eu", porque ao contrário de todos os outros pensamentos, nenhum dos quais é consciente, este pensamento pensante "eu" é consciente, tanto de si mesmo como dos pensamentos que está a pensar. Ou seja, este pensamento pensante "eu" é o sujeito cognoscente, enquanto todos os outros pensamentos são apenas objectos conhecidos por ele.

Este pensamento pensante "eu" é consciente porque é chit-jada-granthi, o "nó" que liga a consciência ao não-consciente. Ou seja, é uma mistura inextrincável do nosso verdadeiro ser sempre-consciente, "eu sou", e este corpo não-consciente (que é apenas um pensamento ou imaginação) e outros pensamentos, que inevitavelmente surgem quando imaginamos a nós mesmos como sendo este corpo.

Nesta mistura inextrincável, "eu sou este corpo", o único elemento real é a nossa consciência fundamental "eu sou". O outro elemento, "este corpo", é meramente uma imaginação, e portanto ele é criado apenas pelo nosso acto de pensar. Quando não pensamos nada, como no sono profundo, este corpo não existe, assim como um corpo-sonhado não existe quando não estamos a sonhar.

Uma vez que o que existe em todos os nossos três estados de consciência, vigília, sonho e sono profundo, é apenas a nossa consciência fundamental de ser, "eu sou", apenas ela é real, e tudo o mais é apenas uma falsa invenção da nossa imaginação. Uma vez que experimentamos o nosso actual corpo acordado só no estado de vigília e não no sonho ou no sono profundo, e uma vez que experimentamos um corpo-sonhado só no sonho e não no estado de vigília ou no sono profundo, estes corpos são meras aparências transitórias, e portanto não podem ser reais, mas são apenas pensamentos que surgem junto com a nossa mente pensante.

De todas as coisas que pensamos ou imaginamos, a raiz é só o nosso pensamento-"eu", que é a nossa mente, a consciência efémera que sempre experimenta a si mesma como "eu sou este corpo, uma pessoa chamada tal-e-tal". Assim, esta falsa experiência "eu sou este corpo" é a nossa imaginação primordial, e porque obscurece a verdadeira natureza de nós mesmos, o nosso puro "eu sou", permite-nos imaginar todos os outros pensamentos.  


Uma vez que a única realidade no nosso pensamento pensante "eu", que é a imaginação primordial "eu sou este corpo", é a nossa consciência essencial de ser, "eu sou", se olharmos com atenção para ela veremos a realidade que subjaz à sua falsa aparência, assim como se olharmos atentamente para uma cobra imaginária veremos a corda, que é a realidade que subjaz à sua falsa aparência.

Uma vez que nenhum outro pensamento contém este elemento essencial de auto-consciência, "eu sou", ao olhar para qualquer outro pensamento não seremos capazes de a reconhecer, a realidade que lhe está subjacente, não importa por quanto tempo e com cuidado possamos olhar para ele. Olhar para outros pensamentos é como olhar para as imagens numa tela de cinema, enquanto olhar para o nosso pensamento pensante "eu" é como olhar para trás para a luz que projecta essas imagens.

Se estivéssemos a olhar directamente para a luz que sai do projector, veríamos não só o filme que se move rapidamente em frente à luz, mas veríamos também a luz brilhante imóvel  por trás desse filme em movimento. No início, o filme em movimento pode parecer obscurecer a luz imóvel por trás dele, mas se continuarmos a olhar para ele de forma constante, os nossos olhos ficarão deslumbrados pela a luz e portanto deixaremos de ver qualquer outra coisa além dela. 

Da mesma forma, quando olhamos directamente para o núcleo da nossa consciência, "eu sou", a sua verdadeira clareza pode parecer à primeira vista estar obscurecida por um incessante fluxo de pensamentos, mas se continuarmos a manter a nossa atenção fixa firmemente nele, ele vai brilhar de forma cada vez mais clara e luminosa e assim gradualmente dissolver todo o surgimento sombrio de pensamentos, até finalmente brilhar sozinho em todo o seu esplendor infinito e glória não-dual.

Pergunta o que deve ser seguido: "olhar para os seus pensamentos", "ver de onde é que eles ocorrem" ou "ver quem faz tudo isso". Como expliquei acima, ātma-vichāra não é olhar para qualquer pensamento que não seja o nosso pensamento primordial "eu", por isso não devemos seguir o conselho de quem diz "olhar para os seus pensamentos", mas podemos seguir qualquer das outras duas instruções ou ambas, "ver de onde ocorrem" e "ver quem faz tudo isso", pois ambas significam essencialmente a mesma coisa.

De onde ocorrem todos os pensamentos? Eles ocorrem, surgem ou aparecem só de nós mesmos, o "eu" que os pensa, e não de qualquer outra coisa. Portanto "ver de onde ocorrem os pensamentos" significa ver a nós mesmos, o "eu" pensante, em cuja imaginação e por cuja imaginação todos os pensamentos são formados.

Da mesma forma, quem faz tudo isto? Tudo - cada pensamento, palavra e acção - é feito apenas por este pensamento "eu". Ainda que as acções físicas possam parecer ser realizadas pelo nosso corpo, e as palavras possam parecer ser faladas pela nossa voz, o nosso corpo e voz são ambos apenas instrumentos pelos quais a nossa mente actua. Todas as acções e palavras do corpo são originárias dos nossos pensamentos, e esses pensamentos são todos pensados apenas por "eu", o pensamento primordial, que é a nossa mente pensante. Portanto "ver quem faz tudo isto" significa ver a nós mesmos, o "eu" que sente "eu estou a pensar", "eu estou a falar" e "eu estou a fazer".

Uma vez que este "eu" que pensa, fala e faz aparece nos estados de vigília e de sonho mas desaparece no sono profundo, não é o nosso "eu" real, mas é apenas um impostor que se apresenta como "eu". No entanto, ele não poderia apresentar-se como "eu" se não contivesse pelo menos um elemento da nossa consciência real "Eu", por isso quando o vemos com muito cuidado, chegaremos a ver o verdadeiro "Eu" que lhe subjaz e lhe dá suporte, permitindo que ele apareça como "eu".  

Ou seja, quando olhamos atentamente para este falso pensamento-"eu", concentrando toda a nossa atenção sobre ele, vamos ver para além do corpo e outros adjuntos imaginários que temos sobreposto nele, e assim reconhecer a pura consciência "Eu" livre de adjuntos que lhe está subjacente, assim como quando olhamos com muito cuidado para a cobra imaginária, vamos ver para além da sua aparência superficial e vamos reconhecer que é na verdade apenas uma corda.

O nosso verdadeiro "Eu" não pensa ou faz qualquer coisa, mas simplesmente é. Ou seja, a sua natureza essencial é apenas ser, e é sempre intocada por qualquer pensamento ou acção. O "eu" que pensa e pratica acção é apenas uma aparência superficial e transitória, uma ilusão que existe como tal apenas na sua própria imaginação auto-enganadora, mas aquilo que parece surgir assim como este falso "eu" que pensa e faz é apenas o nosso verdadeiro ser "Eu". Portanto, quando examinamos a aparência com cuidado, vamos vê-la como realmente é - ou seja, como o ser livre-de-pensamento, livre-de-acção, não-dual, "Eu".

Também perguntou: "Aquele vê não é também mente?" (que eu suponho que quis dizer, "aquele que vê não é também mente?"). Sim, isso que faz esforço para ver a si mesmo, o falso pensamento "eu", é apenas a nossa mente, que em si nada mais é do que este pensamento-"eu".

O nosso verdadeiro ser "Eu" sempre conhece a si mesmo perfeita e claramente, porque a sua natureza é absolutamente pura auto-consciência, por isso não precisa fazer nenhum esforço para praticar Ātma-vichāra. O que precisa fazer esforço para conhecer a si mesmo como realmente é, é apenas a nossa mente, o falso pensamento "eu".

Quando essa mente faz esforço para saber "quem sou eu?" olhando com muito cuidado para si mesma, ela desaparece automaticamente e se funde no seu estado real de claro ser, livre-de-pensamento, auto-consciente, e portanto experiencia-se como o ser real "Eu" que verdadeiramente sempre é. Ou seja, esta mente eleva-se e está activa somente enquanto se ocupa com outros pensamentos - ou seja, com algo diferente de si mesma - mas quando em vez disso tenta ocupar-se apenas de si mesma, ela desaparece e deixa de estar activa, porque sem o suporte imaginário de qualquer coisa diferente de si mesma esta mente não pode manter-se ou parecer que existe.

Quando a ilusão de pensar e de fazer é sobreposta ao nosso ser "Eu", ela parece ser este pensamento "eu", a nossa mente ou ego, por isso a nossa mente depende da sua constante actividade de pensar a fim de sustentar a sua existência aparente. Pensar é a actividade de se ocupar com algo que parece ser diferente de nós mesmos, por isso vai cessar quando concentramos toda a nossa atenção exclusivamente em nós mesmos, e portanto a nossa mente pensante desaparecerá no nosso estado natural de claro ser auto-consciente, em que ela deixará de ser este pensamento-"eu" e em vez disso permanecerá como o ser "Eu" que sempre realmente é.

Finalmente pergunta: "Apesar de a graça do guru estar sempre a fluir, por que é que nem sempre conseguimos praticar atma vichara?". A Graça está sempre disponível em abundância no nosso coração, onde ela brilha claramente como a nossa consciência real, "eu sou", mas para beneficiar dela completamente devemos render-nos a ela inteiramente tornando a nossa atenção ahamukham (voltando-a em direcção a si mesma) e assim mergulhá-la interiormente.

Nós só podemos manter a atenção fixa em nós mesmos na medida em que tivermos amor genuíno para o fazer. Enquanto ainda sentirmos o desejo de experimentar qualquer coisa diferente do nosso verdadeiro ser, os nossos desejos irão impelir-nos a pensar nessas coisas e, portanto, iremos sucumbir repetidamente em pramāda ou auto-negligência, deslizando do nosso estado natural de auto-atenção vigilante ou clara auto-consciência.








Qualquer que seja o amor que agora temos por afastar-nos dos objectos dos nossos desejos e atender apenas ao nosso verdadeiro ser, "eu sou", ele foi acendido no nosso coração só pela graça do guru, e tendo acendido uma vez a chama deste amor, a graça continuará a protegê-lo, a alimentá-lo e a ajudá-lo a florescer, tal como um jardineiro iria proteger e nutrir uma planta linda que ele fez brotar da semente.

A Graça está certamente fazendo a sua parte, como sempre fez e sempre fará, por isso cabe a nós fazer a nossa parte, rendendo-nos a ela, atendendo a ela exclusivamente, e assim permitir que nos engula na perfeita clareza de pura auto-consciência, que é a sua verdadeira forma. Quanto mais perseverarmos no nosso esforço para atender apenas ao nosso ser, mais claramente a luz da graça brilhará no nosso coração como "eu sou", e assim mais ela inflamará o nosso amor por sermos sempre auto-atentos.

O nosso amor por sermos auto-atentos é verdadeira bhaktisvātma-bhakti ou amor pelo nosso próprio ser - e a sua intensidade é directamente proporcional à intensidade da nossa vairāgya ou  libertação do desejo de atender a qualquer coisa que não seja nós mesmos. Queremos atender a outras coisas só por causa da nossa falta de verdadeira vivēka, discriminação ou julgamento correcto - a capacidade de distinguir entre o real e o irreal, o eterno e o efémero, e discernir que a verdadeira felicidade só existe no nosso ser real e não em qualquer aparência efémera como a nossa mente ou os objectos dos seus desejos.

A verdadeira vivēka só pode surgir a partir da clareza interior da mente e do coração, que é acesa em nós pela clara luz da graça, que sempre brilha dentro de nós como "eu sou". Portanto, quando prestamos atenção à nossa consciência essencial de ser, "eu sou", estamos a abrir o nosso coração à influência da graça, permitindo-lhe que brilhe claramente dentro de nós acendendo e nutrindo a clareza da verdadeira vivēka no nosso coração.

Quando começamos a praticar ātma-vichāra - auto-investigação ou auto-percepção - estamos a iniciar um processo que vai aumentar cada vez mais, como uma bola de neve rolando monte abaixo, porque quanto mais atendermos a "eu sou", mais claramente o vamos experienciar, e quanto mais claramente o experienciarmos, mais claramente a verdadeira vivēka brilhará no nosso coração, permitindo-nos assim libertar-mo-nos dos nossos desejos e amarmos cada vez mais intensamente ser auto-atentos, até finalmente a nossa mente  ser engolida para sempre na absoluta clareza da auto-consciência imaculadamente pura.








Tradução: Blog Texto Meditativo

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