sábado, 28 de setembro de 2013

Auto Conhecimento - III






Bhagavan Sri Ramana Maharshi no Salão de Colmo


Fonte: 

 Autor: Arvind Lal 




O Vidya da Vichara - III; "Anbu-punume"   


... Continuação da Postagem anterior: "Auto-Conhecimento - II"



Na parte I desta série, mencionei que o Hino Anma Viddai contém uma instrução extraordinária relativa ao Auto-Conhecimento e à prática da Vichara. Esta instrução vem na última estrofe, que, recorde-se, foi composta por Bhagavan especialmente porque Ele queria incluir Sri Arunachala no hino. De facto, está no último verso do hino, tornando-se uma espécie de conselho de despedida de Bhagavan. O último verso, maravilhosamente rimado e musical, é:


Arulum venumeAnbu-punumeInbu tonume

literalmente:

Graça também é necessária; Ter AmorA Bem-aventurança florescerá"


"Anbu-punume" é traduzida por diferentes estudiosos em diferentes versões do Hino Anma Viddai, como: "ser possuído de amor", "ter amor", "amor é adicionado", ou "o amor é necessário". Essencialmente, Bhagavan está a dizer no último  verso do Seu hino que o "Amor" é um ingrediente essencial para o sucesso no Auto-Conhecimento, na prática de Vichara. Isto, na minha humilde opinião, é extraordinário e vale a pena um olhar mais atento.


A Graça é a contrapartida para o Amor?



Voltando aos diferentes comentários e traduções disponíveis  de
Anma Viddai, praticamente todas as versões ligam o ingrediente "ter Amor" a "Graça". No hino, "Anbu-punume" vem logo depois de "Arulum venume", e logo depois de o Senhor Arunachala ser mencionado. Esta é geralmente a forma como a Graça é compreendida: que a Graça da Entidade que você segue, adora, flui para si em troca do amor e da devoção que, como sadhaka e devoto, você tem demonstrado para com a referida Entidade. A extensão da Graça é proporcional ao amor que você coloca em acção. Alternativamente, você tem de amar na medida adequada o estado de Dei-dade, ou estado de Eu-dade, isto é, o estado da Entidade que para si é sagrada, de forma a ser Agraciado com esse estado.


Assim, os diferentes comentários sobre "Anbu-punume" alargam-se livremente por: "ter amor para Ser", "ter amor pelo Ser", "ter amor por Sri Arunachala Shiva (ou Deus em qualquer forma)" ou "ter amor por Bhagavan". Isto, então, permitiria à Graça tão necessária fluir do Ser, de Sri Arunachala, de Deus em qualquer forma, ou de Sri Bhagavan, conforme a escolha.


Pessoalmente, creio que esta é uma interpretação muito simplista. Em primeiro lugar, ela traz muita confusão para a Vichara. O ensinamento é buscar a Fonte, ou é demonstrar amor, devoção, e adoração para com a Divindade? Então por que buscar a Fonte? Basta mostrar intenso amor por Deus, essencialmente abraçar a devoção plena, ter o direito de receber a Graça, e já está?



Em segundo lugar, e mais importante, se pensarmos um pouco, devemos chegar à conclusão por nós próprios de que se a Graça fosse a contrapartida do amor por uma Entidade, ou de qualquer outra coisa além disso, então não seria "Graça", não é verdade? Bhagavan afirmou repetidamente que a Graça está sempre fluindo, a Graça está sempre disponível. Nos Seus ensinamentos, a Graça nunca é contrapartida de nada. Ela escolhe quem Ela escolhe (pelos Seus próprios critérios desconhecidos e insondáveis). Ele dizia que o próprio facto de você praticar Vichara é devido à Graça. Assim, a prática da Vichara qualifica-se como sendo o cumprimento de um dever obrigatório por parte do Sadhaka. A suprema expressão de amor por Ele, então, é fazer só Vichara. E, assim, não havia necessidade para Bhagavan de mencionar "amor", separadamente, em Anma Viddai, se fosse amor POR uma Entidade ou estado.


A instrução é para "juntar" amor durante a Vichara"?


Pode surgir a seguinte dúvida: Bhagavan está a dizer que quando buscamos a Fonte na Vichara, temos de "adicionar" amor ao processo? Gerar um sentimento de amor para com a Divindade ou o Ser? Para verificar isto (por favor não se riam), durante algumas cessões de Vichara, eu tentei "adicionar" amor quando me encontrava profundamente interiorizado, buscando a Fonte do "Eu". Durante essas tentativas, tive o cuidado de manter a emoção o mais pura possível, aquele amor pelo Divino, por Bhagavan, pelo Senhor Arunachala, pela Mãe Divina, e assim por diante. Na minha humilde opinião, não é possível fazer isso. A tentativa de gerar qualquer emoção quando nesse estado, ainda que seja a mais sattvika e pura das emoções, de imediato gera uma onda de movimento na mente que nos retira da Vichara. Então, estou absolutamente certo de que a expressão "o amor é necessário " NÃO é uma instrução para incluir "amor" durante a Vichara". A conclusão lógica óbvia, então, é: você tem que entrar no processo da Vichara vivenciando todos os sentimentos obrigatórios, conforme necessário, já enraizados em si, "Amor" incluído.



A importância de "Arulum venume; Anbu-punume"


Neste ponto, pode ser útil fazer uma pausa e ponderar porque é que o último verso de Bhagavan é importante. Já tive oportunidade de mencionar que acredito que ele representa o conselho final, de despedida no hino de Bhagavan. Também acredito que ele é dedicado ao sadhaka que faz Vichara  sinceramente, tal como prescrito por Bhagavan, e que ao atingir um certo grau de sucesso na sua prática, é capaz de perseguir o "Eu" até que o sentimento "Eu" é muito forte dentro dele. Agora, ele chegou ao ponto em que os seus esforços não podem ir mais além. É quase como se houvesse uma porta que se recusa a abrir, por mais que ele se esforce (faz-me lembrar o fantástico lamento de Bob Dylan - "knock, knock, knockin’ on heaven’s door..." ("toc, toc, tocando à porta do Céu...").



Creio que este conselho de Bhagavan é dado para esse momento. Bhagavan está a dizer que todos os esforços levam a essa porta, e depois é tudo com a Graça; e com o "Amor" que vem incrustado em si. Com efeito, dado que a Graça está sempre presente e sempre fluindo, esse Amor incrustado torna-se a chave que abre a porta, ou corta o "cit-jada-granthi", citando o termo técnico por vezes usado por Bhagavan.


Pessoalmente, creio que Bhagavan se refere a um requisito profundo e fundamental no sadhaka: ter "Amor", por si só; "Amor", que é a outra face do Ser como sat-cid-ananda.


O que é este "Amor"?


Ironicamente, é não ter qualquer amor, isto é, amor que seja limitado e dirigido para qualquer entidade ou estado, Divino ou de outra forma. Para explicar isto, deixe-me citar este fascinante extrato do próprio Bhagavan:

(Fonte: "Cartas do Sri Ramanashramam" de Suri Nagamma: Carta nº 179, intitulada "O Caminho do Amor"; Um jovem perguntou a Bhagavan por que não amar a Deus e seguir o caminho do amor...)



“… Quem mais há para ser amado? O próprio Amor é Deus,” disse Bhagavan.

“É por isso que lhe pergunto se Deus poderia ser adorado através do caminho do amor?” disse o interlocutor.

“Isso é exatamente o que eu tenho dito. O próprio Amor é a verdadeira forma de Deus. Se ao dizer, ‘eu não amo isto; eu não amo aquilo’, você rejeita todas as coisas, o que permanece é Swarupa, isto é, o Ser inato. Isso é pura felicidade. Chame-o de pura felicidade, Deus, Atma ou o que quiser. Isso é devoção; isso é realização e isso é tudo”, disse Bhagavan.

“O significado do que acabou de dizer é que devemos rejeitar todas as coisas exteriores que são más, e também todas as que são boas, e amar apenas a Deus. É possível a alguém rejeitar tudo, dizendo isto não é bom, aquilo não é bom, a não ser que o experimente?” disse outro.

“Isso é verdade. Para rejeitar o mal, você deve amar o bem. No devido tempo, esse bem também irá parecer um obstáculo e será rejeitado.  Assim, primeiro, você deve necessariamente amar o que é bom. Isso significa que você deve primeiro amar e depois rejeitar aquilo que ama. Se você, portanto, rejeitar tudo, o que resta é o Ser. Esse é o verdadeiro amor. Aquele que conhece o segredo desse amor encontra o próprio mundo cheio de amor universal”, disse Bhagavan e retomou o silêncio.


Então, Bhagavan diz, não ter amor por nada, mas "ser amor". Todos nós sabemos que a vida de Bhagavan, e a maneira como Ele a viveu, é em si um grande ensinamento para nós. Por isso, temos que olhar para Ele para compreender o que significa "ser Amor". Ele incorporou o Amor, Amor que era sentido de imediato por quem quer que tenha vindo à Sua presença. Foi mostrado na compaixão para com os animais, as plantas e as árvores, na firme determinação de compartilhar igualmente com todos, na gentileza e cortesia de comportamento, na consideração demonstrada para com os ladrões que Lhe bateram, para com as abelhas que foram autorizadas a picar na Sua perna, e em um milhão de outros assuntos. A vida de Bhagavan em si mesma nos dá o exemplo perfeito do "Amor", muito além das capacidades de pessoas comuns como eu e você.


A instrução "Anbu-punume" ("ter Amor")


Ouço alguém dizer: "Ei, espere aí! Há aqui um caso da galinha e do ovo, se precisamos ter esse Amor. Esse Amor só é possível no Jnani, ou seja, após Auto-realização; como podemos dizer então que  esse Amor é o pré-requisito para o sucesso na Vichara e necessário para a Auto-realização?"


Sim, isso é verdade. O sadhaka não pode nunca chegar à extensão do Amor embutido em Bhagavan, o grande Jnani. Isso só é possível quando ele ou ela é Auto-realizado. Mas também é claro, pela sua utilização no hino
Anma Viddai,  que a frase “Anbu-punume” se destina ao sadhaka, e não como sendo descritiva do estado do Jnani. E assim, na minha humilde opinião, é uma instrução de que o sadhaka deve também conscientemente tentar gerar nele ou nela certas qualidades específicas que se aproximam, ou igualam a posição ideal, como exemplificado por Bhagavan e pelo Jnani.


De certa forma, tudo depende do carácter e psiquismo do sadhaka, e da difícil questão de haver ou não pré-requisitos necessários para  Vichara e Auto-realização. Acredito que há muito mérito nas disciplinas tradicionais de "Yama", "Niyama", etc. pelas quais o sadhaka teve de passar nos velhos tempos, pois elas construíram as qualidades necessárias nele ou nela de uma maneira formal. Mas deixando o treinamento espiritual formal um pouco de lado, por muito que ele possa acontecer, o sadhaka tem de evoluir muito em carácter para chegar perto do ideal de "ser Amor".



Vichara por si só não cuidará  disso?



Pode dizer-se que, no que diz respeito à Vichara, o próprio processo de intensa introversão desenvolve estas qualidades de um modo informal. Eu acrescentaria que o sadhaka pode assumir que, se periodicamente a sua Vichara fica às vezes bloqueada, é porque certas qualidades necessárias ainda estão sendo construídas através do processo (em certo sentido, as vasanas estão sendo limpas), e um maior avanço só acontecerá quando o processo estiver completo. E assim, se ele ou ela é travado na "porta" que se recusa a abrir apesar de todo o 'tocando', ela só vai abrir quando o "Amor" enraizado no sadhaka se aproximar de um nível tal como explicado na nota de Bhagavan acima exposta. E a questão é que pode ainda demorar uma eternidade, se as vasanas básicas forem demasiado fortes para serem eliminadas rapidamente.


Para o Auto-conhecimento despontar, creio eu, precisamos trabalhar arduamente. Bhagavan bem sabe o que a Vichara pode ou não fazer, e, ainda assim, no hino Ele menciona especialmente "ter Amor". Isso só pode significar que, além da nossa prática da Vichara, ainda precisamos trabalhar conscientemente o nosso comportamento, a nossa postura, o nosso carácter em geral.


No Sri Ramanasramam cruzei-me com sadhakas que fazem Vichara durante horas nos salões, mas depois vi-os cá fora mostrando crueldade para com os outros por pequenas transgressões. E não apenas numa única explosão de raiva. Assim não.



Portanto, o amor que podemos ter por nós e pelos nossos empreendimentos, pelo nosso companheiro, pela nossa família, pelos nossos bens, precisa expandir-se para incluir um círculo muito mais amplo. Deveríamos sentir a dor do cachorrinho esfomeado mancando pela estrada, da mãe-macaco que perdeu o  seu filhote, da árvore cujos ramos foram violentamente arrancados pela equipa de manutenção da estrada, da pedinte idosa e solitária sentada na berma da estrada sem nenhuma pessoa amiga no mundo, do recém-chegado melancolicamente sentado no salão lutando com a Vichara, sem saber nada do que se trata e fazendo barulho, do grão de arroz que não foi comido e se encontra abandonado no prato como se estivesse dizendo "eu sobrevivi à tempestade e à seca e aos gafanhotos ao longo de tantos meses para me oferecer a ti, mas tu abandonaste-me mesmo assim..."; e então depois poderemos "ser Amor".


Os caminhos de Jnana são um pouco enganadores, na medida em que podemos olhar para eles como atos secos, estéreis; basta sentar-se, fazer Vichara e perseguir o "Eu", é tudo o que é necessário. Na verdade, este é também o equívoco fundamental em relação ao Advaita em geral. Podemos encontrar resmas de escritos expressando admiração sobre como o lógico confesso Sri Sankara conseguiu compor hinos de derreter o coração, como Sri Meenakshi Pancharatnam e Sri Saundarya Lahiri, para nomear apenas dois (e por isso devem ter sido erradamente atribuídos a ele, ou deve haver duas ou até três pessoas com o nome "Sankara"). Eu posso apostar qualquer coisa em como se o advento de Bhagavan tivesse sido há mil anos atrás, nos tempos em que os registos históricos eram raramente feitos, hoje teriam dito que o autor de Ulladu Narpadu nunca poderia ter composto também Arunachala Aksharamanamalai ou qualquer um dos outros hinos devocionais; que  deve ter havido duas pessoas chamadas "Ramana" separadas por uns 100 anos mais ou menos, um seguindo o caminho de Jnana e o outro Bhakti. O que é pouco compreendido é que, de facto, um verdadeiro Advaitista também é a maior personificação do Amor; de "Rasa"(*) (literalmente "Suco", como oposto de ser "seco"). Porque, no verdadeiro Advaitista, o Amor tornou-se "Universalizado",  da forma como Bhagavan explicou no extrato referido acima.


Se há "Amor", Vairagya não desaparece?


E então a dúvida pode ser: diz-se ao sadhaka para praticar intensa Vairagya (renúncia); afinal a instrução é de que o mundo é irreal e, portanto, não vale a pena correr atrás dele. Como, então, pode o sadhaka ser também convidado a "ser" Amor? Bem, paradoxalmente, à medida que Vairagya se desenvolve no sadhaka, ele ou ela "sente" mais intensamente. Ou seja, todas as grandes e puras emoções. Temos o grande exemplo de Bhagavan, de novo, que começava a chorar ao ler histórias devocionais como as do Periya Puranam, para espanto dos que se sentavam à sua volta. A Personificação de Vairagya e de Jnana, derramava  profusas lágrimas juntamente com a mulher que chorava pela perda do seu bebé, enquanto os outros que por ali deambulavam, os homens do mundo presumivelmente cheios de sentimentos, se sentavam com o rosto impassível, esforçando-se por mostrar alguma emoção. Ou ria-Se também quando alguma piada engraçada era dita, ou alguma história feliz contada.


O segredo de Vairagya NÃO é que você não precise de "sentir", mas que você permaneça desapegado. Você não precisa ir à procura do sofrimento para mostrar "sentimento" ou fazer "bem", mas se você encontrar sofrimento, faça o melhor para ajudar com amor e atenção, ainda assim permanecendo desapegado de tudo. Neste contexto, lembro-me da famosa história Zen "O Rio" (também chamada "A Estrada Enlameada"; a versão abaixo foi recolhida aleatoriamente da internet):

Dois monges Zen, Tanzan e Ekido, estavam viajando em peregrinação, quando chegaram à travessia de um rio lamacento. Lá viram uma linda mulher jovem elegantemente vestida com o seu kimono, obviamente sem saber como atravessar o rio sem estragar as suas roupas. Ela ia a um casamento, e estava a chorar sem saber o que fazer. Sem mais delongas, Tanzan pegou nela graciosamente, segurou-a contra ele, e atravessou o rio lamacento, colocando-a no chão seco. A jovem ficou muito feliz e agradeceu a Tanzan profusamente. Então ele e Ekido continuaram o seu caminho. Horas depois, chegaram a um templo de hospedagem. E aqui Ekido não pôde mais conter-se e soltou as suas queixas: "Certamente é contra as regras, o que você fez lá atrás... Tocar numa mulher simplesmente não é permitido... Como é que pôde fazer isso?... E ter um contacto tão próximo com ela!... Isto é uma violação de todos os protocolos monásticos..." Assim continuou ele com toda a sua verborreia. Tanzan ouviu pacientemente as acusações. Finalmente, durante uma pausa, disse: "Olha, eu pousei a rapariga outra vez do outro lado. Tu ainda a trazes ao colo?".


Receio que algumas críticas me estejam a ser dirigidas por estar eventualmente a ler demasiado numa frase inócua de Bhagavan. Afinal de contas, por que não a deixar no ponto tradicional de que Graça é necessária, e de que para isso é preciso amar a Divindade apropriada; por que ir buscar um significado tão complexo para o "Amor"?


Bem, depois de me ter debruçado durante tantos anos sobre os escritos de Bhagavan, há uma coisa que posso afirmar com segurança, é que Ele nunca escreveu nada como sendo apenas uma frase "inócua". Cada palavra e cada frase escrita por Ele tem camadas de significados que emergem numa reflexão mais profunda. Mas, certamente, o significado pode brilhar de forma diferente para cada um de nós. O atrás exposto é a forma como a frase "Anbu-punume" de Bhagavan, no contexto da Vichara e Auto-conhecimento, brilha para mim. E, ei, se a sua Vichara ficar presa num ponto em que você sente que não está a chegar a lugar algum, tente também "ser Amor" como uma característica inata interior, e reflectida para o exterior em todas as interações do mundo igualmente!


Novamente, apenas um esforço muito humilde de compartilhar, amigos...




* Nota do Blog Texto Meditativo:
Rasa - palavra do Sânscrito. Num contexto espiritual, significa Néctar Divino - o sabor da iluminação. Na linguagem comum, é usada com o sentido de essência, seiva ou sumo de plantas, sumo de fruta, a melhor ou mais delicada parte de qualquer coisa.


Tradução: Blog Texto Meditativo




Bhagavan e o coelhinho


Ó Arunachala! Fica silenciosa, descansanda aí (no meu coração) para que
o mar de felicidade possa surgir e a fala e os pensamentos cessar

Arunachala Aksharamanamalai


sábado, 21 de setembro de 2013

Auto Conhecimento - II


Bhagavan Sri Ramana Maharshi



Fonte:


 Autor: Arvind Lal 




O Vidya da Vichara - II; "Quem ou De onde sou eu?"    


... Continuação da Postagem anterior: "Auto-Conhecimento - I"


As obras curtas de Bhagavan são realmente especiais. A sua concisão implica que Bhagavan só poderia incluir os aspetos fundamentais da prática, e apenas as teorias imperativas respetivas, em relação aos Seus ensinamentos. Então, as obras curtas de Bhagavan fornecem ao devoto uma visão única sobre o que o próprio Bhagavan considerava extremamente importante em relação à Sadhana. Isto é verdade em especial para um trabalho como Anma Viddai, que diz respeito ao Auto-Conhecimento, e que foi composto sem quaisquer influências contextuais.
Assim, as partes do hino que foram cortadas na Parte I, que compreende o enquadramento teórico fundamental para a prática, não são menos importantes. Elas não estão a ser especialmente consideradas nesta Postagem apenas porque pensei manter o foco nos aspectos práticos. Como exemplo, desejo mencionar o primeiro e sublime verso, que serve de introdução para todo o trabalho. Este verso fornece uma espécie de pré-requisito para a prática; o tema básico é de que o mundo é irreal, então não corra atrás dele. Isso é puro Advaita, o próprio Sankara poderia tê-lo escrito.

  1. Verdadeiro, forte, para sempre viçoso se ergue o Ser. É dele na verdade que surge o fantasma corpo e o fantasma mundo. Quando esta ilusão é destruída e nem uma partícula permanece, o Sol do Ser brilha resplandecente e real na vastidão do coração expandido. Trevas morrem, aflições terminam, e a Bem-aventurança brota.

Além disso, antes de começarmos o nosso debate, deixe-me dizer que estou consciente do facto de que cada um de nós teria desenvolvido o seu próprio estilo de fazer Vichara.  Uma prática espiritual desta natureza requer um alto nível de convicção por parte do sadhaka. Isso faz com que, naturalmente, sejam mantidos fortes pontos de vista sobre o que constitui a Vichara. Mas, ainda assim, creio eu, é importante a troca de ideias de vez em quando, uma maneira simples de aperfeiçoar e desenvolver a nossa prática. É com este espírito que  são apresentadas estas ideias sobre a Vichara, um trabalho muito humilde de partilha de opiniões. Permitam-me, contudo, apresentar sinceras desculpas no caso de alguém se sentir perturbado com alguma coisa apresentada aqui, ou na Parte I.


 O papel de "Quem sou eu?" ou "De onde sou eu?"


As instruções de Bhagavan no que diz respeito à prática da Vichara indicada no poema Anma Viddai são breves e simples:

“Inquirindo interiormente, pergunte ‘Quem sou eu? e de onde vem este pensamento ?’
Todos os outros pensamentos desaparecem.”

Pensei em pegar nesta instrução muito básica em primeiro lugar, na perspectiva de que ela não representa uma linha de pensamento fora do comum quanto à prática da Vichara, do seguinte modo:

<<<"Quem sou eu?" ou "De onde sou eu?" é apenas uma ferramenta para conduzir a mente de volta para o "Eu" interior. As instruções são: sempre que existe quebra de atenção e um pensamento surge, perguntar "para quem surgiu este pensamento?" A resposta é "para mim". Depois pergunte "Quem sou eu?", e assim a atenção recua, dirigida dos assuntos exteriores para o sentido de "Eu" interior. Mas se é possível, por outros meios, localizar e manter o sentimento de "Eu", "Quem sou eu?" não é necessário. Além disso, qualquer ferramenta alternativa para chamar a atenção para o "Eu" é igualmente boa, e pode ser usada com a mesma eficácia.>>>


Aqueles que praticam Vichara regularmente podem ter a experiência de que ao fim de algum tempo o sentido de "Eu" interior começa a aparecer quase instantaneamente. Então, 'Quem sou eu?" pode até nem ser necessário para iniciar a focagem no "Eu". Posteriormente, durante algum tempo "Quem sou eu?" pode ser usado ocasionalmente para enfrentar o problema das ondas de pensamentos externos que podem ainda inundar a mente. Mas, mesmo neste caso, para uns poucos, no devido tempo a mente fica treinada em pensar os pensamentos externos por uns minutos e em seguida desligar-se, retornando por si mesma ao pensamento "Eu". A inquirição "Quem sou eu?" passa a parecer de algum modo supérflua. Assim, para o praticante regular, é possível certamente focar a atenção no "Eu" sem o uso de "Quem sou eu?" Ou "De onde sou eu?"


(O acima exposto deriva das minhas conversas ao longo dos anos com pessoas que fazem Vichara regularmente. E também, devo confessar, da minha experiência pessoal. Houve uma fase em que eu fazia Vichara sem muito "Quem ou De onde sou eu?"; eu talvez dissesse mentalmente uma ou duas vezes, para iniciar, numa espécie de rotina de forma desprovida de qualquer intensidade. Percebi que  estava a "agarrar" o "Eu", sim, mas uns momentos depois sentia que na verdade não estava a chegar a lugar algum. A mente é tão arguta, ela faz só um pouquinho para embalar um pessoa, levando-a a pensar que algo está a ser alcançado...).


A abordagem acima descrita, na minha humilde opinião, é um recuo significativo da posição ideal. Muda o poderoso 'Inquira e Busque' de Bhagavan para a abordagem coxa 'Segurando o "eu"'. Usando a excelente comparação de Bhagavan do mergulhador de pérolas, o sadhaka então flutua na superfície do oceano, por assim dizer, mergulhando de vez em quando a cabeça debaixo de água, mas nunca mergulhando profundamente nas profundezas para encontrar a pérola escondida lá em baixo.


Estou a lutar para conseguir pôr esta ideia em palavras, mas aqui vai de qualquer modo: é evidente que existe um sentimento de "eu" localizável rápida e imediatamente pela maioria de nós, mesmo sem o "Quem sou eu?"; mas se o "Eu" interior é abordado com o sentido intensamente concentrado de inquirição e investigação contido nas expressões "Quem sou eu?" ou "De onde sou eu?", o sentido de "Eu", que surge, surge com uma leve mas significativa diferença em relação ao sentido "eu" de 'base' referido anteriormente. É como se surgisse um sentido composto, de "eu" e "Quem sou eu?" e "De onde sou eu?", todos juntos, uma sensação desconcertante no final, quando comparada com  a sensação que surge da outra forma; e que tem a tendência natural para mergulhar mais profundamente interiormente. É claro que não é como se existisse um "eu" diferente, que assim é encontrado. Mas parece que a intensa "intuição-interior" do sentido de "Quem ou De onde sou eu?", ao aproximar-se do "Eu", faz com que o "Eu" seja agarrado cada vez com mais força, sem esforço consciente adicional. Se usássemos a segunda excelente comparação de Bhagavan do cão procurando o seu dono seguindo o cheiro, o cheiro do "Eu", lenta mas seguramente, torna-se cada vez mais forte por si mesmo.



Afinal, quando buscamos a Fonte do "eu", não buscamos em qualquer local físico dentro do corpo, nem em qualquer outro lugarConsidera-se que o Coração está 'localizado' simplesmente no lugar até onde o "eu" pode ser rastreado. E o "eu" é rastreado, não de um local físico para outro dentro do corpo, por exemplo, mas sempre onde o "cheiro" do sinal nos leva. Assim, usando a comparação de Bhagavan, o cão fareja à distância o cheiro do dono, no chão, é verdade, mas ele é alheio ao chão que está percorrendo na sua busca; ele simplesmente vai por onde sente que o cheiro está a aumentar de intensidade. Da mesma forma, na minha humilde opinião, na Vichara tentamos excluir todos os aspectos locacionais de onde está o "eu", e persegui-lo em termos de - vamos para onde a intensidade do sentimento de "eu" é cada vez maior, alheios a tudo o mais. E isto acontece naturalmente se "Quem ou o De onde sou eu?" for intrínseco à nossa prática de Vichara.


Em praticamente toda a obra composta por Bhagavan, e numa grande fatia das conversas gravadas, o ensinamento da prática da Vichara tem sido, invariavelmente, 'pergunte "Quem sou eu?" ou "De onde sou eu?"'; Inquira, e busque a Fonte. Apenas raramente, sobretudo nas conversas, são mencionadas variações como "tente e esteja sem pensamentos", "segure o "Eu"(como acto distinto da busca da Sua Fonte)", "observe a respiração", "observe o intervalo entre dois pensamentos", e assim por diante. Acredito que Bhagavan insistia em ir-dentro através da via do "Quem ou o De onde sou eu?" porque, de uma forma não muito compreendida pelo sadhaka, o impacto interno é radicalmente diferente do que por outra viaAinda que, na verdade, isso tenha tornado a prática muito mais difícil. Assim, "Quem ou De onde sou eu?" é, certamente, também a 'ferramenta' para levar a atenção de volta para o "Eu" quando a mente vagueia; é, no entanto, muito mais do que isso, primeiro.
 
(Nota: Para aqueles que podem não estar familiarizados com as comparações de Bhagavan do 'mergulhador de pérolas' e do 'cão buscando o seu dono': são abordadas com mais detalhes na minha postagem "Arunachala Pancharatna Varttikam e Vichara"de 20 de Abril de 2012.)


Além disso, na minha humilde opinião, há outra razão para a utilização de "Quem ou De onde sou eu?", o tempo todo, quer seja necessário ou não. Na tradição Indiana cabe ao sadhaka seguir as instruções do Guru implícita e totalmente; esse é o seu principal dever. E o verdadeiro shishya (discípulo) fará isso sem nenhuma expectativa de recompensa, de qualquer tipo, nem mesmo da Graça do Guru. Bhagavan, de qualquer modo,  manteve de forma consistente que a Graça está sempre fluindo, sempre à disposição de todos, sem excepção. Mas de uma forma inexplicável, eu creio, as coisas melhoram se as instruções do Guru são seguidas ao ponto. E então, por que dar a Alguém a oportunidade, lá 'em cima', de dizer "mas ele nunca seguiu as instruções do seu Guru ..." 


Neste contexto, lembro-me das reminiscências de "Sundaram" (Swami Trivenigiri Sadhu), registadas no maravilhoso "Ramana Smriti Souvenir" [A partir da edição de 1980, publicado pelo Sri Ramanasramam; as páginas não são numeradas nesta edição que aqui tenho, mas o extrato a seguir é retirado do artigo "Cozinhados de Bhagavan", que se encontra a meio do livro]:

“Com o tempo, percebi que trabalhar com Bhagavan na cozinha não era meramente cozinhar, mas definitivamente uma forma de treinamento espiritual. A primeira lição de educação espiritual, a aprender para sempre, é obedecer ao Guru implicitamente, sem questionar ou no mínimo usar o próprio julgamento. Nada o faria tão feliz como quando ele via que tínhamos entendido este ponto essencial, que as instruções do mestre deviam ser imediatamente levadas a cabo, e não deviam ser adiadas pelo desejo de lhe agradar ou até mesmo de o fazer correctamente. Mesmo se soubéssemos de uma maneira melhor de o fazer, tínhamos de o fazer exatamente como o mestre nos tinha dito. Poderia ter parecido que, obedecendo-lhe, o trabalho iria ficar arruinado, mas ainda assim era preciso obedecer. É preciso dominar esta arte da obediência instantânea e inquestionável, pois o segredo da realização encontra-se na rendição absoluta e renúncia ao próprio julgamento.”

Que grandes palavras escritas por um homem muito simples!

E também a seguinte nota de Sampurnamma [de "Bhagavan na Cozinha", o mesmo Ramana Smriti Souvenir]:

“Enquanto seguíssemos as suas instruções, tudo correria bem com a nossa culinária. Mas no momento em que agíssemos por conta própria, estaríamos em apuros. Mesmo assim, se buscássemos a sua ajuda, ele iria provar o nosso preparado e dizer-nos o que fazer para tornar o alimento apto a ser servido. Cada pequeno incidente na nossa cozinha  continha uma lição espiritual para nós. Assim, aprendemos a arte da obediência implícita enquanto aperfeiçoávamos as nossas habilidades culinárias sob a orientação de Bhagavan.”

Deixe-me terminar esta parte citando a mesma instrução, como a de "Anma Viddai", de "Nan Yar?" (Sri Ramanasramam: versão de Q & A):

Q10. Como é que a mente se torna inactiva?

Resposta: Através da inquirição "Quem sou eu?". O pensamento "quem sou eu?" destruirá todos os outros pensamentos, e, como o pau usado para mexer a pira ardente, ele mesmo, no final, será destruído. Então, surgirá a Auto-realização.



…………

continua: Auto Conhecimento - III
Tradução: Blog Texto Meditativo

Fotos:  Blog Texto Meditativo


Recordações do Salão Grande
Sri Ramanashramam

















domingo, 8 de setembro de 2013

Auto-Conhecimento - I



Autor Arvind Lal




Arthur Osborne: Bhagavan estava recostado no seu sofá e eu estava sentado na primeira fila diante dele. Ele sentou-se de frente para mim, e os seus olhos estreitaram-se trespassando-me, penetrantes, intimistas, com uma intensidade que eu não posso descrever. Era como se eles dissessem:

"Tem-lhe sido dito, por que não percebeu?"

["Pétalas Perfumadas", pág 44]



O Vidya da Vichara - I   
O Hino: Anma Viddai  (Atma Vidya, Auto-Conhecimento)


"Um dia, um devoto veio perante Bhagavan e referindo-se aos versos de abertura deste poema - "Oh, muito fácil é o Auto-Conhecimento, Oh, muito fácil mesmo"- perguntou como poderia ser assim, como poderia a Libertação ser fácil. Bhagavan respondeu prontamente: "Como é que eu hei de saber?" Então, apontando para Muruganar disse: "Pergunte-lhe a ele, foi ele que escreveu!"

(Esta história é de TR Kanakammal)
(Excerto de "Parayana - As obras poéticas de Bhagavan Sri Ramana Maharshi",
Sri Ramanasramam, Ed.2008, Pg 120)



Anos antes, em Abril de 1927, Muruganar tinha entregado a Bhagavan estes versos, com o pedido de os desenvolver. A resposta de Bhagavan foi os cinco poemas chamados Anma Viddai ou "Auto Conhecimento". [os versos de Muruganar eram uma reformulação deliberada de um poema popular, Tamil, que diz:



"Oh, muito difícil é o Auto-Conhecimento".



Bhagavan contou a seguinte história sobre o poema (Fonte: "Dia a Dia", 26-2-1946 Manhã):
Muruganar tinha escrito o refrão (pallavi) e o refrão suplementar (anupallavi) e queria as estrofes (charanams). Ele disse que não conseguia completar a canção, pois as palavras não lhe vinham à ideia, e pediu-me para a completar. Em consequência disso, escrevi esta canção. Primeiro escrevi apenas uma estrofe ou Charanam, mas como Muruganar queria pelo menos quatro, então fiz mais três. No fim lembrei-me de que eu não tinha feito qualquer menção a Annamalai
* e assim escrevi um quinto Charanam e nele mencionei Annamalai, tal como Ponnambalam é mencionado nos versos da canção da história de Nandanar, que serviu de modelo para o nosso cântico.


* O Monte sagrado Arunachala é também conhecido pelos nomes Arunagiri,
  Annamalai Hill, Arunachalam, Arunai, Sonagiri e Sonachalam.

O Hino


Refrão


Oh, muito fácil é o Auto-Conhecimento,
Oh, muito fácil mesmo.


Refrão suplementar


Mesmo para os mais enfermos, tão real é o Ser
Que, em comparação com ele, o amalaka [o fruto groselha] na mão parece uma mera ilusão.
Oh, muito fácil é Auto-Conhecimento,
Oh, muito fácil mesmo.



Texto

1. Verdadeiro, forte, para sempre viçoso se ergue o Ser.
    É dele na verdade que surge o fantasma corpo
    e o fantasma mundo. Quando esta ilusão é destruída
    E nem uma partícula permanece, o Sol do Ser brilha
    resplandecente e real na vastidão do coração expandido.
    Trevas morrem, aflições terminam, e a Bem-aventurança brota.



2. O pensamento ‘eu sou o corpo’ é o fio no qual
    estão atados muitos pensamentos. Inquirindo interiormente,
    pergunte ‘Quem sou eu? e de onde vem este pensamento?’
    Todos os outros pensamentos desaparecem. E como ‘Eu-Eu’ na câmara do Coração,
    o Ser brilha por si mesmo. Esta Auto-consciência é
    o único Céu, esta quietude, esta morada de Bem-aventurança.

   
3. De que serve conhecer outras coisas que não o Ser?
    E sendo o Ser conhecido, que outra coisa há para conhecer?
    Aquela luz una que brilha como muitos eu's,
    veja este Ser interior como um relâmpago de consciência;
    É a graça actuando; o ego morrendo;
    É o desabrochar da Bem-aventurança.



4. Para soltar laços de karma, findar nascimentos,
    Este caminho é o mais fácil de todos os caminhos.
    Permaneça em quietude, sem agitação da língua, da mente ou do corpo.
    E contemple o esplendor do Ser interior,
    Experiência da eternidade; ausência de todo o medo;
    O vasto oceano de Bem-aventurança.


5. Annamalai, o Ser, o olhar por trás do olhar da mente,
    que vê o olhar e todos os outros sentidos, que conhece o céu e outros elementos,
    o Ser que contém, revela, percebe o céu interior que brilha dentro do Coração.
    Quando a mente livre de pensamento se volta para dentro,
    Annamalai aparece como meu próprio Ser.
    A verdadeira graça é necessária; junta-se o amor e a Bem-aventurança brota.




Reflexão preliminar



Antes de começar propriamente com a Vichara, desejo abordar a implicação revelada no refrão: 'Oh, muito fácil é o Auto-conhecimento, Oh, muito fácil mesmo', acompanhado pelo refrão suplementar, de que o Eu é mais facilmente evidente do que o proverbial amalaka (o fruto groselha) colocado na palma da mão.

Então o Ensinamento é categórico de que o Auto-conhecimento é muito fácil de obter? O Próprio Bhagavan claramente evitou a pergunta directa, como contado na história acima, dizendo: "Como é que eu hei de saber? Pergunte a Muruganar ". Mas sabemos que estão registadas várias conversas nos livros de reminiscências, onde Bhagavan falou no sentido de que o Auto-conhecimento é o caminho mais fácil de todos. Talvez uma pista sobre o que realmente quis dizer se adivinhe através do que Bhagavan falou no exemplo do amalaka usado como refrão suplementar no hino:


(Excerto do "Dia a Dia", 26-2-46 Manhã; estas linhas precedem o extrato deste livro mencionado na história acima como consta no livro "Parayana"):


“Em seguida, a conversa derivou para o Ser como sendo auto-evidente (pratyaksha) e Bhagavan então relatou como a canção Atma Vidya foi composta. Ele disse: "Qualquer vidya tem o propósito de conhecer algo. Se é assim tão auto-evidente ao ponto de tornar o exemplo clássico bem conhecido do hastamalakam ou groselha na palma da mão uma falsa analogia, como Muruganar mencionou, que necessidade havia de Atma Vidya, quer você o chame de fácil ou não? O que Muruganar quis dizer foi: 'No exemplo clássico, é necessário uma mão, uma mão que vai sentir e pode sentir um fruto nela, um fruto, um olho que pode ver, uma pessoa que já tenha sabido que fruto é, e assim por diante. Mas para conhecer o Ser, nada excepto o Ser é necessário. "No sono, por exemplo, para nós nada existe excepto nós mesmos, e admitimos que existíamos durante o sono. Ao acordar dizemos "eu dormi” e nenhum de nós acredita que existem dois "eus”, aquele que dormiu e aquele que está agora acordado. No exemplo clássico, todos aqueles factores têm que existir para tornar o fruto auto-evidente. Tudo aquilo depende ou deriva do Ser e torna o fruto auto-evidente. Quanto mais auto-evidente não deve o próprio Ser ser?”



Então Bhagavan está a querer dizer que: Para ver o amalaka são necessárias muitas coisas – o próprio amalaka, a palma da mão, o olho, luz, o processo cognitivo, a mente, etc. (e o Ser também!). Por outro lado, no que diz respeito ao Ser, cada um de nós, instruído ou não, pode facilmente confirmar o sentimento “eu-sou” dentro de nós sem quaisquer factores intermédios. O Ser já é conhecido por todos como a experiência directa  da nossa existência,  o sentimento interior de “Eu”.  E ninguém tem a menor dúvida da sua existência contínua através da vigília, sono com sonhos ou sono profundo. Assim, Atma Vidya, o Auto-conhecimento, já é bem conhecido, e é de facto muito “fácil”; muito mais do que o conhecimento do desafortunado amalaka!


Além disso, tanto quanto para o nosso amalaka, outros caminhos podem precisar também de muitos factores para o Conhecimento despontar, enquanto que para  Atma Vidya o Ser precisa apenas do Ser. Assim, o caminho do Auto-Conhecimento é, sem dúvida, o caminho mais directo e mais curto em comparação com todos os outros caminhos. Neste sentido também, Atma Vidya é "fácil" (ainda que possa envolver sadhana “difícil”).


O termo utilizado, portanto, NÃO é no sentido de ser tudo "fácil" por contraposição a "difícil" em termos de prática. Pois, como diz Bhagavan, se fosse fácil, nesse sentido, qual seria a necessidade de qualquer Atma Vidya? Dado que todos nós já conhecemos o Ser como sentimento de "eu sou" dentro de nós, deveríamos ser imediatamente Auto-realizados.

Mas não somos. E se ainda não somos, então, obviamente, o Auto-conhecimento não é assim tão fácil para nós. Ainda existem vasanas, tendências inatas muito fortes em jogo, que turvam as águas, e que precisam ser extintas em primeiro lugar.


Então, "O Auto-conhecimento é muito fácil”? Acredito que a resposta só pode ser essa frase muito útil aplicável a uma série de enigmas espirituais - "Sim e Não". Em última análise, a parte fácil ou difícil depende de nós, depende de quão 'maduros' estamos e do grau de seriedade e sinceridade do esforço que colocamos em jogo.


Finalmente, para além do exposto, creio que Atma Vidya também é referido por Bhagavan como sendo fácil (no refrão e no verso 4 aqui mencionados, e noutras conversas), no sentido de proporcionar uma garantia ao sādhaka de que a meta final é absolutamente alcançável. O caminho pode ser difícil, íncrivelmente difícil mesmo, mas não importa o quão distante o sadhaka começa, Bhagavan garante o sucesso.


Atma Vichara - Inquirição do Eu-superior
do Poema Anma Viddai


Olhemos para este grande hino novamente, removendo o refrão e o refrão suplementar, e também alguns outros versos de acompanhamento - aqueles que não descrevem directamente a prática associada com Atma Vidya. Nas linhas que se seguem, nem uma palavra foi modificada. O resultado é, então, o diamante brilhante que emerge, um modelo para Atma Vichara nas próprias palavras Divinas de Bhagavan:


Anma Viddai


Inquirindo interiormente, pergunte ‘Quem sou eu? e de onde vem este pensamento?’
Todos os outros pensamentos desaparecem. E como ‘Eu-Eu’ dentro da câmara do Coração,
o Ser brilha por si mesmo.

Veja este Ser interior como um relâmpago de consciência;

Permaneça em quietude, sem agitação da língua, da mente ou do corpo.
E contemple o esplendor do Ser interior,

Quando a mente livre de pensamento se volta para dentro,
Annamalai aparece como meu próprio Ser.
A verdadeira graça é necessária; junta-se o amor e a Bem-aventurança brota.


Nota: As Instruções são Sequenciais


Há um aspecto importante das instruções contidas no hino, que se torna evidente apenas quando são apresentadas na forma isolada é que seguem uma ordem sequencial. Pode observar-se que as instruções acima fluem suavemente dos versos de uma estrofe para os versos da seguinte.


Pensei em destacar este facto em primeiro lugar, por no passado ter citado este versículo 4 para justificar uma prática que evita o trabalho prescrito, nos versículos anteriores, com referência à Vichara. Isoladamente, os versos no versículo 4: "Permaneça em quietude, sem qualquer agitação da língua, da mente ou do corpo, e contemple o esplendor do Ser interior", podem ser tomados como uma prática alternativa dada por Bhagavan, que requer ao sadhaka não fazer nada, mas "simplesmente ser". É apresentado o argumento de que isto, então, iria entrar em sintonia com o grande ensinamento de Bhagavan "Summa Iru" – Manter Silêncio, e é, portanto, considerado como uma prática mais elevada, superior, em comparação com a luta dia a dia em busca da Fonte.


Mas a questão é que, de qualquer modo, se você está lutando com Vichara básico, então você não está "maduro" o suficiente para "permanecer em quietude ... e contemplar o esplendor do Ser". se a Vichara se tornou fácil para si, é que você pode então esperar alcançar aquele estado facilmente. Assim, um simples teste para ver se você está pronto para "apenas ser" é: experimente fazer Vichara; é sem esforço? 'Você' encontrou instantaneamente o Ser e permaneceu como Isso? Então, de algum modo, está tudo feito! Se não, então você precisa continuar com a prática de Vichara tal como dada por Bhagavan.


Assim, na minha humilde opinião, a sequência acima é mais ou menos assim:


Faça Vichara ... veja o Ser resplandecer ... permaneça em quietude.


A prática principal mantém-se: "Inquirindo interiormente, pergunte: ‘Quem sou eu, e de onde vem este pensamento?’"


Inquira e Busque.

…………

continua em: Auto Conhecimento - II
Tradução: Blog Texto Meditativo
Fotos:  Blog Texto Meditativo

Recordações do Salão Grande - Sri Ramanashramam

Bhagavan e devotos em 1936



O Salão, à hora do chá
com suas paredes recobertas de História










Bhagavan almoçando



Recordações de Arunachala
 

Arunachala Shiva


"knock, knock, knockin’ on heaven’s door..."

"toc, toc, tocando à porta do Céu..."

Conhece-te a ti mesmo


Gruta em Arunachala




 
O Caminho